Sou professor noTécnico há 34 anos e como tal não posso ficar indiferente ao que se passa na minha Escola. Nunca ao longo de todo este período vi os meus colegas e os meus alunos tão desanimados e descontentes. Embora eu próprio não seja normalmente dado à depressão, o meu estado de espírito não pode deixar de reflectir este ambiente depressivo.
Agora que a pandemia já acabou, somos defrontados com outro mal: um conjunto de medidas, que dá pelo nome de MEPP, que nos foi imposto como algo inevitável, ao qual todos temos que nos submeter “porque não há outro remédio”.
Segundo o meu testemunho, enquanto docente desta Escola, é verdade que antes da introdução do MEPP as coisas já não andavam muito bem: insuficiência de espaços e docentes para tantos alunos, altas taxas de reprovação, e outros problemas que não vou aqui enumerar, para não me alongar demasiado.
Prometeram-nos que o MEPP seria como que uma panaceia que iria resolver tudo. Pessoalmente, nunca acreditei nisso, mas compreendo que muitos colegas tenham tido essa esperança.
Afinal, o que se viu?
A grande mudança que se verificou no sistema de ensino foi que este praticamente deixou de se preocupar com a aprendizagem dos alunos para se focar apenas na avaliação. Isto acontece por várias razões. Em primeiro lugar, a introdução dos períodos de ensino de 7 semanas (prática que já se tentou introduzir noutras partes do mundo e que foi, em muitos casos, rejeitada) . Não é preciso ser muito entendido em pedagogia para se perceber que não é a mesma coisa ensinar aos alunos, ao longo de 14 semanas, um certo conjunto de conceitos (dando-lhes tempo para os assimilarem e os aplicarem na prática) ou debitar-lhes esse mesmo programa em velocidade dupla, despachando-o em 7 semanas. É como ver um filme de 2 horas em metade do tempo (tecnicamente é possível, mas ninguém vai perceber nada). Mas esta não foi a única alteração. Disfarçada de ‘avaliação contínua’ , generalizou-se a prática de multiplicar os momentos de avaliação das disciplinas, de tal modo que actualmente os alunos têm, em média, que enfrentar 2-3 avaliações por semana. Sejamos realistas: nas cadeiras do 1º ciclo do IST, com rácios de cerca de 100 alunos por docente, é impossível fazer avaliação contínua. Para haver tal tipo de avaliação, é necessário uma interacção próxma com os alunos, coisa que só acontece nalgumas cadeira de mestrado, em que não há mais de 20 alunos por docente. O resultado do MEPP foi que a avaliação por exames ou testes (em massa, impessoal) , que era realizada apenas durante certas épocas, passasse a ser realizada todas as semanas. Não interessa que lhe chamem MAPs ou outra coisa qualquer, a verdade é que não se trata de avaliação contínua, mas apenas de multiplicação de datas de avaliação. E mesmo que, no final, isso possa resultar em taxas de aprovação aceitáveis, tais taxas só são obtidas à custa de uma degradação inaceitável da qualidade do ensino.
A reacção dos alunos do IST a este ‘novo paradigma’ não se fez esperar: deixaram de ir às aulas em que não há avaliação. Por exemplo, neste semestre, de uma aula que eu dou e que deveria ter cerca de 100 alunos (se viessem todos os inscritos), vêm em média 10. Quando tenho oportunidade de perguntar aos alunos porque não vêm ás aulas, a resposta maisfrequente é: com tantas avaliações, não há tempo para ir às aulas. Ficam em casa a preparar o próximo teste ou relatório.
Ou seja, em vez de aprenderem, os alunos limitam-se a treinar-se para responder a certas perguntas-tipo ou ir à Internet buscar texto para encher os relatórios dos trabalhos. Isto na melhor das hipóteses, porque também já são frequentes os casos de simples recurso à fraude.
Pergunto-me assim se será aceitável que nós, docentes do IST, nos deixemos reduzir à condição de robots a programar outros robots.
Urge fazer algo para for fim à desumanização do Técnico.
Pedro T. Lima
Departamento de Matemática